segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Dentro da Casa (Dans la Maison)

Direção: François Ozon
País: França
Ano: 2012





François Ozon sempre mistura gêneros em seus filmes; se em Ricky (2009) ele brinca com a fantasia e o surrealismo para expor as teorias de Freud, em relação a super proteção da mãe, em “Dentro da Casa”, coloca o espectador como personagem e criador da estória, e personagens como espectadores, brincando com a psicanálise nas projeções criadas por um indivíduo que se espelha e/ou rapassa a outro.

Na trama, Germain (Fabrice Luchini), professor de redação de uma escola pública, apoia o aluno Claude Garcia (Ernst Umhauer) a desenvolver sua escrita. Este por sua vez manipula o professor escrevendo redações que contam seus dias vividos na casa de um colega de aula. Claude mistura fantasia e realidade, confundindo seu mentor, e detém um modo irônico de escrever, expondo seus desejos internos e suas atrações sexuais, que vão acabar interferindo na vida pessoal de Germain.



Suspense, melodrama e sátira ao cotidiano da vida da classe média são as bases de sustentação do longa e, nós, espectadores, vemos o roteiro sendo escrito e construído com a interferência de ambos os personagens. Claude é observador e percebe detalhes repugnantes da vida cotidiana, e junto a isso seus sentimentos adolescentes vão se aflorando e a beleza das “donas de casa” da quais ele frequenta, vão inebriando seu olhar atento, Kristin Scott Thomas e Emmanuelle Seigner tornam-se sex symbols através das lentes de Ozon. As frustrações do professor vem à tona, e ele projeta-se em Claude, que sem pudores vai instigando e construindo sua estória, que por vezes sofre interferências de todos os personagens.


Ozon embaralha a percepção do espectador curioso, deixa-nos interessados pela vida alheia, e desamparados com a nossa (ou a de Germain) que entra em colapso, lembrando o clássico de Hitchcock, Janela Indiscreta. E por falar em clássico, impossível não notar a referência da “Trilogia do Apartamento” de Polanski, onde toda (ou quase toda) trama desenvolve-se “dentro da casa”.

Gustavo Halfen

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Killer Joe – Matador de Aluguel (Killer Joe)

Direção: Willian Friedkin
País: EUA
Ano: 2011





A princípio, ao olhar para a capa e o título de Killer Joe, nos remete obviamente a mais um filme de  ação hollywoodiano, a diferença é quem está da direção: Willian Friedkin, o famoso diretor de um dos filmes mais polêmicos do cinema, O Exorcista (The Exorcist, 1973). Todas as obras de Friedkin vão ao limite do caos e, em Killer Joe não é diferente. Na capa temos um frango empanado no formato do estado do Texas, e você, caro leitor, não tem ideia de onde estes símbolos/objetos irão se encontrar.

Na trama temos Chris (Emile Hirsch) e seu pai Ansel (Thomas Haden Church) contratando o matador de aluguel Joe Cooper (Matthew McConaughey) para matar sua própria mãe e dividirem seu seguro de vida. Porém, como garantia, Joe exige uma noite com a irmã de Chris, a doce e pura Dottie (Juno Temple). A partir disto temos uma rede de intrigas e farsas que levarão o ser humano aos seus maiores pesadelos.



Willian Friedkin brinca com os tabus e debocha do estilo de vida estadunidense. Seu filme foge do cenário comercial, a violência extrema é tão exagerada que caminha entre a comédia e o trash. A desconstrução do modo de vida “americano” é representado pelo próprio frango da capa; enquanto que Dottie, a garotinha de 12 anos nos remete a pureza esperançosa que temos ainda no homem, porém neste povo marginalizado que mata a mãe e vende a irmã, fica difícil achar um herói, e confiar em alguém é enganar a si próprio.

Gustavo Halfen

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Only God Forgives

Direção: Nicolas Winding Refn
País: França, Tailandia, EUA
Ano: 2013


Depois do sucesso de Drive, primeira parceria do diretor Nicolas Refn com o ator Ryan Gosling, que rendeu o título de melhor diretor de Cannes em 2011 para Refn, o público e a crítica ficaram esperançosos com o retorno da dupla Refn/Gosling em um novo projeto. Porém, o que não se cogitava era que o diretor dinamarquês, após dirigir o pesado e belo Valhalla Rising em 2009 (traduzido no Brasil como O Guerreiro Silencioso), já tinha quase todas as cenas de Only God Forgives na cabeça e, foi convidado pelo ator Ryan Gosling para dirigir um filme nos EUA de um roteiro e estória de terceiros. Ele aceitou e inseriu parte das referências que usaria em “Only God...” no aclamado Drive. A partir desta informação fica mais claro dizer que Drive faz alusão a “Only God...” e não o contrário, embora soe estranho.

Only God Forgives, assim como Valhalla Rising, é uma obra bastante pessoal do diretor; que traz à tona sua crise existencial: medos, crenças, revoltas e redenções, que antes de ter apelo comercial, vêm com o objetivo principal de autocura. Fazendo-se assim óbvia a dedicatória do filme a Alejandro Jodorowsky, diretor de filmes surreais que buscavam uma auto cura e redenção de pesadelos próprios e da humanidade em suas obras.

Na trama, os irmãos Billy (Tom Burke) e Julian (Ryan Gosling), comandam um clube de boxe na Tailândia que serve de fachada para o tráfico de drogas. Após estuprar e matar uma garota, Billy é assassinado por Chang (Vithaya Pansringarm), ex policial e justiceiro de Bangkok. Logo a mãe dos irmãos (Kristin Scott Thomas) aparece em cena e exige de Julian, vingança.


É impossível não notar a fotografia neon do longa, e a utilização intensa de vermelho que exclui quase todas as outras cores do espectro; dando uma visão infernal e onírica de um purgatório, que funciona bem, mergulhando o espectador neste mundo, mas  dificulta a narrativa.

O agradecimento nos créditos a Gaspar Noé e David Lynch, também tornam explícitas as referências utilizadas pelo diretor. A violência extrema e o clima fantasioso do filme confundem o espectador entre o que é sonho e realidade. Vemos Julian tendo devaneios e confrontando sua natureza versus seus princípios, através da relação edipiana e conturbada que possui com sua mãe. Temos também a desconstrução mesclada com a homenagem do confronto entre o bandido e o mocinho em personagens bastante estilizados e caricatos; a espada como arma de luta e a honra em duelos faroeste são referências evidenciadas e intercaladas com a máfia da pollícia de uma Bangkok colorida e neon.

Only God Forgives é uma experiência única, mas que irrita a crítica mais convencional; o filme irritou grande parte da platéia que o assistiu em Cannes. Porém seu humor etéreo garante que nem tudo ali é sadismo. O oitavo filme do diretor, que tem estreia em agosto nos cinemas, se aproxima mais de Valhalla Rising do que Drive, pois aqui o herói está a mercê de um ser superior, que não lhe dá esperança de redenção.


Gustavo Halfen