quinta-feira, 6 de junho de 2013

O lugar onde tudo termina (The place beyond the piles)

Direção: Derek Cianfrance
Ano: 2012
País: EUA




Seria muito difícil analisar este filme sem liberar alguns spoilers. A obra de Derek Cianfrance é dividida de certa forma em capítulos, tendo algumas reviravoltas. O que me levou a necessidade de citar algumas cenas que podem prejudicar o desenvolvimento do filme, se este texto for lido antes de se ver o filme. Portanto, para um leitor e espectador mais atento, sugiro que leia esta crítica após a sessão de cinema.

I
Ao início temos o corpo malhado e tatuado de Luke (Ryan Gosling) brincando agilmente com um canivete, e como um ser onipotente ele veste sua jaqueta e sai de uma espécie de camarim, se deparando com um público ávido por sua presença que, os desperta aplausos. A câmera o segue pelas suas costas, até ele subir em uma moto e mostrar sua coragem no famoso Globo da Morte de um circo da cidade. Luke é um tigre, com seu corpo tatuado ele demonstra coragem e liberdade em seu olhar.

Após seu show, Luke se encontra por acaso com Romina (Eva Mendes), uma mulher a qual teve um breve caso em um passado não tão distante, e descobre ter um filho com ela. O motoqueiro abandona a vida no Globo da Morte e decide ter um trabalho em que consiga dar condições para que seu filho cresça em um ambiente tranqüilo; “Eu tive um pai ausente e olha o que eu me tornei, não quero que com ele seja assim.” Luke demonstra uma preocupação sincera em relação ao fato de ser pai, mas seu novo trabalho na oficina mecânica de seu amigo Jack (Bem Mendelsohn) não lhe dá condições mínimas para pagar suas próprias contas, e ele decide utilizar sua habilidade de piloto de moto para assaltar pequenos bancos. Com dinheiro na mão a vida melhora, mas sua sede por poder aumenta, e logo ele é morto em uma tentativa de assalto.

Mesmo Luke sendo um bandido, sua sinceridade por dar uma vida tranqüila ao seu filho, torna-nos cúmplice de seus atos criminosos; filmados em plano sequência, além de nos dar a sensação de estarmos no mesmo ambiente do crime, torcemos para que nada de errado aconteça. Quando ele é assassinado pelo policial Avery (Bradley Cooper) na primeira hora do filme, assim como em Psicose (onde Hitchcock mata sua protagonista logo de início), aqui o espectador também se vê perdido, sem ter um personagem para seguir pelo resto da trama.


II
O policial Avery também se vê ferido no acontecimento que levou a morte de Luke, e quando acorda no hospital, é saudado como herói, o qual bravamente matou um delinquente que vivia à beira da sociedade. Porém, a consciência deste “herói (“anti-herói” para nós: espectadores onipresentes), está bastante abalada; primeiro por matar o criminoso sem motivo aparente, e segundo porque descobre que Luke, assim como ele, também tem um filho de colo e, que este crescerá sem conhecer seu verdadeiro pai. A situação se agrava quando descobre seus companheiros de trabalho fazendo parte de uma rede de corrupção que alimenta o crime o qual Avery quase perdeu a vida tentando combater.

É interessante perceber que quando víamos Luke roubando para satisfazer suas necessidades como pai, não sentíamos tamanho remorso que agora nos toma conta ao ver tais policiais abusando do poder para satisfazer seus egos e desejos de ambição. Avery, tomado pela necessidade de limpar sua consciência, decide declarar guerra contra a corrupção da polícia local, tornando-se assim, membro do ministério público do estado de Nova York.

Neste segundo ato, temos um novo protagonista: o policial Avery. Uma nova temática é abordada: a corrupção no meio policial e político; como no segundo Tropa de Elite (José Padilha), onde vemos a criminalidade a partir de um outro olhar em relação ao primeiro filme; uma visão mais ampla, justificando a cascata de crimes até chegar na periferia da sociedade.

III
Passam-se quinze anos, e por uma coincidência do destino, o filho de Avery, AJ, torna-se amigo do filho do falecido Luke, Jason. Ambos não sabem de suas relações do passado; eles estão mais preocupados em ficarem chapados com quaisquer drogas que apareçam na frente, como uma espécie de fuga por sentirem seus pais ausentes de suas vidas, um devido ao trabalho, o outro devido à morte. Os dois jovens se entendem bem, e o longa poderia ter acabado por aqui de forma excelente, mostrando que apesar de toda a luta por um ideal de sociedade, Avery não consegue nem proteger seu próprio filho do submundo das drogas; porém o diretor Cianfrance tem outros planos para o futuro deste dois descomprometidos amigos.

Se em “Namorados Para Sempre” Derek Cianfrande brinca com o universo atemporal, indo e vindo na estória, aqui o diretor demonstra total controle do tempo, que agora é linear, apresentando continuidade através das conseqüências dos atos de um passado que foi densamente evidenciado no primeiro ato.

Com o tempo Jason passa a questionar sua mãe sobre o paradeiro de seu pai, e nós, espectadores, torcemos para que ele saiba que seu pai morreu tentando lhe dar uma vida melhor, mesmo que de forma criminosa (o longa não julga os atos que Luke utilizou para tentar sustentar seu filho). Logo a verdade vem à tona, e não demora para que o conflito do passado coloque na encruzilhada tanto AJ e Jason, como Avery.

Neste terceiro ato, a trama passa a dar ênfase ao drama adolescente, além de revelar o “efeito borboleta”: fatos do passado que repercutem no futuro. Jason passa a ser o protagonista da estória, o espectador se identifica com ele, torcendo para que descubra dentro de si o espírito de liberdade e coragem presente em seu pai.

Cianfrance cria uma rede de intrigas ligadas por acontecimentos em diferentes tempos e personagens; são três contos com protagonistas distintos, que se ligam de forma harmônica em uma estória contínua e bela, onde se questiona e analisa, de forma não julgadora, o crime marginal, a corrupção policial e as consequências de atos que irão repercutir em um futuro inesperado.

Estreia dia 7 de junho nos cinemas!
Gustavo Halfen

Nenhum comentário:

Postar um comentário